O INSTANTE SÓ É ÚNICO QUANDO NEM O FIM É CAPAZ DE SILENCIÁ-LO

A redação do jornal O Povo fez-se casa, botoeira de ensinamentos e princípios seguidos até hoje por mim. As frases ditadas pela professora Adisia Sá e datilografadas na máquina que Blanchard Girão me ensinou a valer-me. As primeiras redações corrigidas por Milton Dias, a nobreza e gentileza do J.C. de Alencar Araripe o companheirismo entre os fotógrafos Mauri Melo, Alcebíades (o Bia), Manoel Cunha e Edson Pio. Como esquecer a primeira vez nas “rotativas”, levado pelas mãos de Agílio, o Piloto, o barulho e o cheiro ainda estão vivos em minha memória. Assim como as lições de amizade, ética inflexível do mestre, ídolo e companheiro, Tancredo Carvalho. O papai, entre a redação e as ruas, quase que acarinhando os leitores do O Povo com suas mais belas e comoventes luzes escritas, aqui tomo por exemplos os nunca mais registráveis e pra sempre perpetuados: último gol do Campo do Prado e os primeiros do Presidente Vargas e Castelão.
E ainda dizem que fibra de papel jornal não é boa pra fazer reciclagem. Mentira, porque é disso que sou fruto, eu sou reciclado, e é assim que me sinto. Sou feito do que já passou, do que nunca deixará de existir, da vontade de informar sem alterar uma luz sequer, mas hoje tendo que enquadrar, vez ou outra, bem aqui e logo ali. Concebido da lucidez do que ainda está por vir, e com a maturidade que por alguns é apontada como coisa do passado.
Meu trabalho hoje é fruto dos ares dos 36 anos de serviços prestados por papai ao Jornal O Povo. Entrou logo depois da guerra, em 1947, e foi de lá o dinheiro pro meu primeiro brinquedo: uma máquina fotográfica. Eu tinha pouco mais ou pouco menos que oito anos, e ele já dizia a todos: "meu filho será o que quiser, desde que fotografe". Ao invés de uma bola ou uma bicicleta, ele me deu a chance de fotografar e eternizar milhares delas. E assim fiz e vou fazendo, inspirado na prudência e doçura dele que o tornaram capaz de educar – junto à amiga, tão companheira e amada Nilza – seus três filhos, dois deles colegas de profissão, além de amigos.
É por isso que me vejo fruto da reciclagem do que já aconteceu e que pra sempre ficou. Sou reciclado de tudo aquilo que hoje me faz, da lembrança do setor de fotografia do Jornal O Povo que desde o dia 19 de agosto de 1999 leva o nome "Fotógrafo José Rosa de Araújo". Sou reciclado da perspectiva do Zé Rosa Neto que, nascerá e haverá de fazer uma foto minha, numa digital moderníssima que seja, e montará com graça, quem sabe, as (os) rosas que foram, que são e que nunca deixarão de ser. Sou reciclado da lembrança daquele gato que, em 1979, confundia a redação com sua casa ou com suas ruas, e que, numa cadeira do O Povo, querendo dar uma de jornalista, teve sua luz flagrada pela suave, e não menos terna, lente do mestre Rosa. Sou feito aquele gato, sem botas, de rua e pra sempre de casa. Sou reciclado de papel jornal O Povo, onde aprendi a eternizar cada instante.
5 Comments:
Arrasou, José! amigo reciclado de um passado presente e futuro.
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Anônimo, at 6:26 PM
Pôrra, Zé! Fiquei comovido pra caramba. Imagino que tu tenha chorado escrevendo esse texto. Se tiver, valeu cada lágrima.
Abraço,
Roberto Maciel
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Anônimo, at 12:09 PM
Suas palavras revelaram a sua fotografia mais bonita: a própria alma. Parabéns Zé, tá perdoado, nunca mais conto a história do aniversário da minha mãe. rss ... Abraços
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Anônimo, at 10:43 PM
Zezim, meu fio, espetáculo! Eternizado.
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Anônimo, at 2:43 AM
Sem palavras,a tradução do sentimento, não tem preço.
SGUERRA
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ARTFOTOGRAFY, at 8:51 AM
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