El blog de los 3 amigos

domingo, outubro 20, 2002

Eu ouço as vozes, eu vejo as cores, eu sinto os passos, de outro Brasil que vem aí, mais tropical, mais fraternal, mais brasileiro.
O mapa desse Brasil em vez das cores dos Estados terá as cores das produções e dos trabalhos. Os homens desse Brasil em vez das cores das três raças terão as cores das profissões e regiões. As mulheres do Brasil em vez das cores boreais terão as cores variamente tropicais.
Todo brasileiro poderá dizer: é assim que eu quero o Brasil, todo brasileiro e não apenas o bacharel ou o doutor, o preto, o pardo, o roxo e não apenas o branco e o semibranco. Qualquer brasileiro poderá governar esse Brasil, lenhador, lavrador, pescador, vaqueiro, marinheiro, funileiro, carpinteiro, contanto que seja digno do governo do Brasil, que tenha olhos para ver pelo Brasil, ouvidos para ouvir pelo Brasil, coragem de morrer pelo Brasil, ânimo de viver pelo Brasil, mãos para agir pelo Brasil, mãos de escultor que saibam lidar com o barro forte e novo dos Brasis, mãos de engenheiro que lidem com ingresias e tratores europeus e norte-americanos a serviço do Brasil, mãos sem anéis (que os anéis não deixam o homem criar nem trabalhar), mãos livres, mãos criadoras, mãos fraternais de todas as cores, mãos desiguais que trabalham por um Brasil, sem Azeredos, sem Irineus, sem Maurícios de Lacerda. Sem mãos de jogadores, nem de especuladores nem de mistificadores. Mãos todas de trabalhadores, pretas, brancas, pardas, roxas, morenas, de artistas, de escritores, de operários, de lavradores, de pastores, de mães criando filhos, de pais ensinando meninos, de padres benzendo afilhados, de mestres guiando aprendizes, de irmãos, ajudando irmãos mais moços, de lavadeiras lavando, de pedreiros edificando, de doutores curando, de cozinheiras cozinhando, de vaqueiros tirando leite de vacas chamadas, comadres dos homens. Mãos brasileiras, brancas, morenas, pretas, pardas, roxas, tropicais, sindicais, fraternais. Eu ouço as vozes, eu vejo as cores, eu sinto os passos, desse Brasil que vem aí.

(Texto de Gilberto Freyre, escrito em 1926.)